quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Euforia...

Ela caminhou em sua direção, parou diante dele, que mesmo sem ouvir uma única palavra da boca dela, entendeu que deveria levantar-se. Olhos fixos, coração acelerado, respiração pesada. Senti-la tão perto era o que mais ele queria, tanto quanto lhe apavorava.

Ela era só energia, ele vibrava. Ela o olhava, ele desconsertava. Ela o reconhecia, ele a queria. Sentia medo e desejo, queria voar, queria jogar-se ao abismo, só para sentir o prazer da liberdade, ou o de estar preso. Aquela boca, aqueles olhos, aquele mistério... Sem mais resistir, suas mãos seguiram em direção ao rosto dela.

O ambiente pareceu-lhe menor, teve a sensação de que nada, além dos dois, cabiam naquele lugar. Estava enfeitiçado! Os lábios macios e voluptuosos daquela mulher o envenenaram, e com o veneno mais precioso, que somente a mais perigosa serpente seria capaz de produzir. Estava tão submisso aos seus desejos que em nada mais pensou. Se entregou.

Véus caídos, formas reveladas, arrepios, veias dilatadas, calor... Não tinha mais medo, estava excitado, preparado para receber toda a paixão que ela tinha para lhe dar. E nas curvas daquele corpo sinuoso, ele foi perdendo-se, deixando-se levar para uma arriscada armadilha, da qual não ousou fugir.

Seus corpos, sedentos, estremeciam a cada toque e revelavam o desejo absurdo que ambos tentaram controlar até então. Seios em erupção, boca quente, mãos firmes, lábios úmidos. Ele a segurava com força, numa tentativa de não a deixar escapar. Ela o beijava com ardor e sentia com prazer a rigidez de seus abraços.

Pele nua, mente aberta. Ele percebeu que ela não tinha razões para fugir, seu corpo clamava concupiscente pelo dele, e, então, tudo se encaixou perfeitamente: a paixão com o desejo, o corpo com a alma, o mágico com o real, a virilidade com a delicadeza... Ela, finalmente, rompeu o silêncio com um gemido delirante. Dois amantes, dois seres de muita luz, apaixonados, entregues ao tão esperado momento, sem regras, nem medo, nem amarras, livres!

De repente, sentiu-se sugado por uma força descomunal que lhe esquentou a alma. Fechos de luz, cores, raios... A Deusa. Ali, em formas nunca antes contempladas. Dona de si, guia dele, conduzindo-o no mais mágico e delicioso caminho. Não sabia se contemplava a divindade ou se sedia aos seus mais obscenos desejos. Decidiu segui-la, e viajou.


Achou ter visto a lua, num céu extremamente estrelado. Sentiu uma brisa, que parecia vir daqueles volumosos cabelos. Ouviu o vai e vem das ondas, que levavam e traziam a areia para sua praia, acreditou ser o som mais agradável do mundo: gemiam, sussurravam... Inalou o fresco perfume da mata verde e úmida, como quem contempla a beleza da natureza, saboreando a mais doce fruta oferecida por ela, e colhida com as próprias mãos.

Foi homem, menino, ancião. Um iniciado, que há tempos vem percorrendo seu caminho, mas em nenhum havia realmente se encontrado, e agora, vendo-se tão pequeno e ignorante, aquecido naqueles braços, sentiu-se, enfim, acolhido, bem vindo, e, pela primeira vez, na direção certa.

Nem seus melhores sonhos assemelhavam-se àquele momento, onde a beleza, o prazer e o divino vibravam em notas tão perfeitas. Nenhuma experiência vivida por ele seria capaz de descrever todas aquelas sensações. Nada havia sido tão forte e surreal, ao ponto de fazê-lo compreender o que é o verdadeiro amor, aquele que vai além das nossas rasas convicções sobre este sentimento.

Ah, o prazer... O mais louco devaneio de uma mente e o mais forte pulsar de um corpo...

Foi uma longa e prazerosa viagem, depois da qual, ele compreendeu que nunca mais seria o mesmo. Com os olhos ainda turvos, percebeu a chama de uma das velas que ainda vibrava ao lado das serpentes de fumaça de um incenso, que insistia em queimar. Sentiu que o encanto ainda estava ali. Duvidou estar sóbrio, duvidou ser real e, olhando nos olhos dela, teve a única certeza: "- Sou teu!". E ela, sorrindo, respondeu: "- Há milênios..."

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[Primeira Parte - O encanto]



domingo, 6 de dezembro de 2015

Um Bolero inesquecível...

Quando eu era criança e as pessoas perguntavam "o que você quer ser quando crescer?", eu respondia como quase todas as meninas da minha época, "quero ser bailarina". É difícil não se encantar com a beleza de uma bailarina e seus saiotes, suas pontas de pés e mãos, sua delicadeza e leveza... As pequenas (e até alguns pequenos) ficam enfeitiçados.

Hoje, mais cedo, pelas redes sociais, vi um vídeo de uma música que me remeteu a esse sonho de infância. A música era "Bolero de Ravel", mas, no caso, apresentada por Andre Rieu. Assim que ouvi as primeiras notas dessa música, de imediato, veio-me aos olhos, a imagem de um homem, magro, cabelos claros, sem blusa, dançando em cima de um palco redondo. Tive que procurar.

Esse homem era Jorge Donn, um famoso bailarino argentino, falecido em 1992. Nunca havia procurado informações sobre ele, até hoje. A questão é que, mesmo sem saber de quem se tratava, posso dizer que ele, por volta dos meus oito ou nove anos, me hipnotizou ao dançar esta música.

Lembro-me de está mudando os canais da tv, quando, de repente, me deparo com a tal figura, dançando uma música forte, e, aos meus ouvidos, muito agradável. Parecia uma serpente, bailando sorrateira para sua presa. A coreografia nem de longe lembrava (a mim) a sutileza de uma bailarina, mas aquilo me prendeu, não conseguia sair da frente da tv, e nem queria que acabasse. Fiquei impressionada com aquele homem dançando. Achei mágico.

Não sei explicar exatamente porque aquela cena me chamou tanta a atenção. Talvez por ter gostado da música, ou por achar forte, não sei... Mas, de verdade, arrisco dizer que me encantei pela ideia de ver um homem dançando de forma tão diferente, tão livre, tão do seu jeito. Aquilo, com certeza, mudou minha ideia de dança. Percebi que não precisava usar uma sapatilha, vestidos leves e esvoaçantes, seguir um padrão tão rígidos de passos, para dançar bonito. Vi ali que a dança é uma expressão de liberdade, e que nem sempre precisa ser tão perfeito. 

Certamente, com aquela idade, meus pensamentos não foram construídos desta forma que relatei aqui, e nem saberia recriá-los agora, mas, basicamente, a ideia era algo como "olha, ele parece 'tá' dançando do jeito que ele quer dançar", como se estivesse sendo levando pela música, como se não tivesse criado uma coreografia para ela, e sim, decidido dançar conforme sentisse vontade.

Cresci e não me tornei bailarina. Adoro dançar (o que não significa que sou uma exímio dançarina, estou até bem longe disso), mas nunca passei do básico. Amo a dança e suas várias expressões e sensações. A música, pra mim, é um dos alimentos para a alma e a dança um dos caminhos para o paraíso.

As bailarinas ainda me fascinam, da mesma forma que ainda despertam em mim aquela pequena sonhadora... Quanto àquele homem, serei sempre grata por me emprestar alguns de seus passos, nos vários momentos em que me entreguei à liberdade, dançando sozinha no meu quarto, deixando a música me levar, durante tantos anos...





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